“A cidade não
esqueceu seu passado colonial, responsável pelas toneladas de prata extraída de
suas minas locais. Sua bem preservada arquitetura da época lhe rendeu o título
de Patrimônio Histórico da Humanidade, pela Unesco, uma espécie de prêmio de
consolação por séculos de exploração da miserável população”
Dia I
Vista panorâmica de Potosi |
Saindo de Sucre,
logo pela manhã já me encontrava dentro de um ônibus rumo à Potosí. A viagem de
aproximadamente 04 horas me reservou atípicas e belas paisagens de altitude
entre as áridas montanhas da região.
Nos arredores na
cidade, a visão é impactante, pois a primeira sensação que se tem é estar em um
lugar sem cor numa região aparentemente desértica. Esse fato deve-se a Potosí
estar localizada a 4.090
metros de altitude, sendo uma das cidades mais altas do
mundo.
Ao desembarcar
na rodoviária central, a primeira impressão também não é das melhores. Com ares
de cidade interiorana, pobre e ambiente notavelmente sem higiene, o local
mistura mochileiros de todas as partes, com pedintes, vendedores ambulantes,
trânsito caótico e as intermináveis e constantes buzinas dos carros que por ali
passam.
De taxi, segui
até o pequeno Hostel San Marcos, uma hospedaria incrustada no pequeno centro
histórico da cidade, ponto mais alto da localidade. A medida que avançávamos, a
sensação e impressão sobre a cidade melhorava. O local limpo e tranquilo abriga
uma grande quantidade de monumentos históricos.
Hostel San Marcos |
Naquele momento
já sentia os efeitos da altitude. Com certa dificuldade respiratória por conta
do ar rarefeito – a pressão do ar diminui e se tem a sensação de um ar pesado,
onde devido a sua pouca densidade, a quantidade de oxigênio é baixa – o
primeiro sintoma foi de leve dor de cabeça e estafa sentida em pequenos
esforços físicos até então realizados.
Já me encontrava
próximo ao horário do almoço e logo após realizar o check-in na hospedaria, me
restava apenas alguns poucos minutos para um rápido lanche e saída para um dos
principais atrativos de visitação que por anos representou uma riqueza e
responsável pelo desenvolvimento de Potosí.
Minas de Prata
Entrada de uma das minas |
As minas de
prata de Potosí favoreceram o grande império espanhol por séculos. As jazidas
foram descobertas casualmente, em 1545, por um indígena chamado Hualpa ou
Gualca. Neste mesmo ano foi registrada uma primeira mina no Cerro Rico, uma
montanha que chega a 4.500
metros de altitude, que o espanhol Juan de Villarroel
denominou a “Descoberta”. Ao final do século XVIII contavam-se cerca de 5 mil
bocas de mina, produzindo anualmente 250 a 300 mil marcos de prata. Quase que momentaneamente
a população da então pacata e isolada vila começou a se multiplicar,
transformando-a numa das maiores cidades das américas, chegando a ter, quase
200 mil habitantes.
Para o
deslocamento até uma das minas, me juntei a um grupo formado em grande maioria
por argentinos e num pequeno ônibus nos deslocamos até a base do cerro. Ali
recebemos vestimentas adequadas - macacão impermeável, botas de borracha,
capacete e lâmpadas de cabeça – junto às informações de conduta por um dos
guias do local.
A grandeza do
lugar, junto a centenas de trabalhadores em meios aos recortes do cerro,
entramos em fila indiana em uma das minas ainda ativa. Sem iluminação alguma e
dependendo apenas das lâmpadas individuais, a visão não é privilegiada e a
atenção torna-se fundamental para evitar possíveis desagrados. Conforme
adentramos aos corredores da mina, o espaço vai se tornado estreito, úmido e
com um cheiro atípico. São várias bifurcações e escadarias onde apenas com o
acompanhamento do guia tornaria mais tranqüilo o retorno. Após centenas de
metros adentro da mina me deparei com um pitoresco e impactante monumento.
El Tio, é o
senhor do submundo e dos minérios, ao qual devem ser feitos sacrifícios de modo
a que os mineiros possam encontrar minerais, enriquecer e claro, sair das minas
com vida. Para garantir que o "Tio" tem saciada a sua sede de sangue
são feitos sacrifícios de lhamas à entrada das minas. Além disso são-lhe
oferecidas folhas de coca, cigarros e álcool pelo menos 1 vez por semana.
El Tio |
Centro Histórico
A pé, e ainda
sofrendo com os efeitos da altitude, em um raio de aproximadamente 02 quilômetros entre
as estreitas e desiguais ruas da área central, comecei a visitar as principais
e sugestivas construções.
Cerro Rico ao fundo |
Edifício histórico |
Dentre as dezenas de atrativos culturais, me identifiquei com a Plaza 10 de Noviembro, marco zero da localidade e recheada de boas paisagens refletindo o dia a dia das pessoas que por ali circulam. A maioria dos visitantes cruza várias vezes neste hemiciclo de Plaza e torna-se um local agradável para sentar-se e assistir a cidade de Potosi operar em seu entorno.
Outro grande edifício cultural é a Casa Nacional de
Casa de la Moneda |
A religiosidade é outro marco impar da cidade. Com inúmeros templos datados de vários séculos, a cada esquina o visitante possui uma nova surpresa. Das principais igrejas visitadas, em grande maioria apenas para a observação de suas fachadas, me identifiquei com a Igreja de San Lorenzo. Localizada próximo ao Mercado Municipal, sua apresentação imponente em pedras lavradas dão um toque diferenciado em seu exterior.
Com a noite se
aproximando, muito frio e cansaço ao extremo por conta do dia intenso junto a
dificuldade de oxigenação, o jantar foi cancelado e substituído bolachas e suco
de caixinha para em seguida realizar uma longa noite de sono.
Dia II
Logo pela manhã,
após café matinal típico e simples, em conversa com alguns moradores locais e
sem muito planejamento sobre o que fazer naquele dia, recebi a indicação de
conhecer algumas lagoas com águas termais. Assim, após um pouco de especulação
e contato com uma agência receptiva resolvi optar por conhecer a laguna
Tarapaya.
Laguna Tarapaya
Ao fundo, laguna Tarapaya |
Após reservar um
taxi por intermédio da agência receptiva – vale considerar que esse ato fez com
que o deslocamento ficasse algumas vezes mais caro em relação a uma negociação
diretamente com o taxista – por aproximadamente 40 minutos de estrada sinuosa entre
belíssimas montanhas áridas e de diversas colorações devidos a diferentes tipos
de solo, cheguei a uma pequena propriedade onde se situa a laguna. Ao pagar uma
pequena taxa aos moradores locais que administram a área, o lugar não
surpreendeu. Com um pouco de desorganização, falta de higiene com animais e
aves de criação soltos em meio aos visitantes, mais ao fundo, na base de
diversas formações montanhosas em um cenário de paisagem espetacular a laguna
me aguardava. A temperatura naquela manhã não passava de 10 graus e era
representada por fortes correntes de ventos gélidos. Depois de algumas
fotografias e reconhecimento do lugar, decidi saltar laguna adentro. Com um raio de aproximadamente 30 metros , água
esverdeada e temperatura média de 35 graus, o rápido mergulho fez jus à decisão
de visitar a localidade. Um reflexo social encontrado no local é a incidência
de moradores daquela comunidade que aproveitam a vazão da água quente para
lavagem de roupas e demais objetos pessoais, causando um nítido contraste visual.
Mirante Panorâmico e Mercado Municipal
Retornando a
cidade, entre uma história e outra com o taxista, fui informado sobre um
restaurante panorâmico localizado num ponto estratégico que serviria como um
perfeito mirante de 360º. O visual é
fantástico e o visitante pode obter uma visão privilegiada de toda extensão
urbana de Potosi em sua coloração ocre e uniforme.
De volta ao
centro histórico, após um almoço em um belo restaurante adaptado em uma
construção com detalhes contemporâneos, me restava terminar de visitar alguns
atrativos culturais. Como sempre, me interessei por conhecer o Mercado Central
Municipal, grande espelho dos hábitos e costumes da comunidade que por ali
vive.
Em um espaço
relativamente pequeno, situado na parte baixa do centro histórico, o mercado é
distribuído em inúmeros estandes com produtos convencionais, especiarias com
destaque para a folha de coca e carnes comercializadas sem refrigeração e
higiene alguma.
Dali, o pouco
tempo que me sobrou foi reservado ao retorno à hospedaria para organização dos
pertences pessoais e direcionamento novamente à rodoviária da cidade com
destino à Uyuni, cidade com aproximadamente 20.000 habitantes e que possui o
maior deserto de sal continuo do mundo.